terça-feira, 11 de outubro de 2011

Síndrome X-Frágil




É a causa mais freqüente de comprometimento mental com caráter hereditário, afetando o desenvolvimento intelectual e o comportamento de homens e mulheres.
A expressão "X-Frágil" deve-se a uma anomalia causada por um gene defeituoso localizado no cromossomo X , que, por sua vez, passa a apresentar uma falha numa de suas partes. O X está presente no par de cromossomos que determinam o sexo ( X Y nos homens e X X nas mulheres). Essa falha ou "fragilidade do X" causa um conjunto de sinais e sintomas clínicos (ou uma síndrome). Daí o nome de Síndrome do X-Frágil (SXF).
A principal manifestação dos problemas da SXF revela-se no comprometimento da área intelectiva ou cognitiva: desde dificuldades de aprendizagem até graus leve, moderado, severo ou profundo de retardo mental. Como causa geral de retardo mental, é a segunda causa mais freqüente, sendo suplantada somente pela Síndrome de Down. Diferentemente desta, porém, apresenta um caráter de herança e pode atingir vários membros de uma mesma família, sem revelar características físicas marcantes. Os sinais e sintomas da SXF, por serem semelhantes a outros casos de atrasos e distúrbios gerais de desenvolvimento, necessitam de confirmação através de exame genético com técnicas especiais. A precisão dessa prova pode orientar ou redirecionar tratamentos, visando a torná-los mais específicos. Possibilita, igualmente, aconselhar as famílias afetadas sobre os riscos de recorrência e as possíveis opções reprodutivas.


Famílias de todas raças e grupos étnicos podem ser atingidas pela síndrome, que afeta mais intensa e freqüentemente os homens do que as mulheres.



De acordo com dados de pesquisas e estudos epidemiológicos realizados em países desenvolvidos, estima-se que, na população em geral, 1 em cada 2000 pessoas seriam afetadas pela SXF, manifestando seus problemas. Uma em cada 259 mulheres seria portadora ou carregaria o gene com o defeito que causa a síndrome.Com comprometimento intelectual significativo, isto é, com algum grau de retardo mental, ela atinge aproximadamente 1 em cada 1 250 homens e 1 em cada 2 500 mulheres.Pesquisas indicam que 80 a 90% das famílias portadoras ainda não foram diagnosticadas (dados recentes da Espanha).No Brasil não há estatísticas formais. Constata-se, porém, um freqüente desconhecimento dessa causa de comprometimento mental, tanto por parte de profissionais da área da saúde como da educação e, conseqüentemente, por parte da população em geral.Portanto,não é rara. É pouco conhecida e diagnosticada, já que sua investigação, comprovação e descrição científicas são recentes.
 
Problemas semelhantes de retardo mental, ligados ao cromossomo X e com predominância em homens, foram observados em famílias desde as décadas de 40-50, para os quais dava-se o nome de Síndrome de Martin-Bell.
A SXF foi melhor caracterizada em 1970 através da observação do cromossomo X-Frágil por estudos de citogenética. Mas somente a partir de 1991, é que estudos moleculares identificaram com precisão a causa de tais problemas: a mutação ou mudança ocorrida num gene FMR1 (Fragile Mental Retardation 1). Tal gene localiza-se no cromossomo X e explica a falha (um sítio frágil) em uma das partes desse cromossomo (na porção subterminal de seu braço longo).
O gene FMR1 apresenta, no seu início, cópias repetidas CGG ou Citosina-Guanina-Guanina, que são algumas das bases nitrogenadas que compõem o DNA (molécula de ácido desoxirribunucleico que contém a informação genética, formando os cromossomos).
O número normal dessas cópias varia de 6 a 50. Indivíduos afetados pelos problemas da Síndrome do X Frágil apresentam mais de 200 cópias (mutação completa), o que faz com que não ocorra a síntese de uma proteína essencial para o organismo, denominada FMRP.
Essa falta - que pode apresentar-se em diferentes proporções - repete-se nas células do organismo. Isso compromete várias estruturas e funções orgânicas, principalmente, às ligadas a capacidades mentais.
Indivíduos, que apresentam um número intermediário de cópias (entre 50 e 200), possuem a chamada pré-mutação. Em geral não mostram sintomas, embora possam transmitir a doença.
Estudos sobre as formas de ocorrência desse gene FMR1 vieram esclarecer particularidades importantes, próprias da Síndrome do X-Frágil, tanto na variação de suas manifestações como nas suas formas de transmissão entre os membros de uma mesma família.

A presença do gene defeituoso (FMR-1) pode encontrar-se em estado de pré-mutação (50 a 200 cópias CGG), tornando a pessoa "portadora". Ou, encontrar-se na forma de mutação completa (mais de 200 cópias CGG), tornando a pessoa "afetada".
As pessoas portadoras possuem um defeito menor no gene devido à pré-mutação. Elas podem demonstrar apenas sintomas leves da síndrome ou nenhuma de suas características. Nesse caso, são consideradas clinicamente normais.
Um homem portador, mesmo que não apresente problemas intelectivos, transmitirá a pré-mutação a todas suas filhas, mas a nenhum de seus filhos. Suas filhas, mesmo sem alterações físicas, intelectivas e emocionais, poderão ter filhos, netos, bisnetos ... com problemas, pois serão portadoras.
Cada filho ou filha de uma mulher portadora tem 50% de chance de herdar o gene. Mas se ela for afetada, apresentando retardo mental, a possibilidade de ter filhos também afetados será maior.
A pré-mutação pode ser transmitida de forma "silenciosa" ao longo das gerações de uma família, até que um de seus membros seja afetado pela síndrome.
Estudos recentes revelam que a herança, nesta enfermidade, tem padrões peculiares. Por exemplo, o risco de gerar filhos afetados aumenta em mulheres portadoras e clinicamente normais. Esse fenômeno é chamado de antecipação, isto é, após o surgimento de um caso na família poderá haver um aumento na freqüência de aparição e na severidade da doença em gerações posteriores, pois o número de cópias CGG tende a aumentar de geração a geração.

As mulheres, tendo dois cromossomos X, apresentam duas cópias do gene FMR1. No entanto, elas são mais raramente afetadas pelos problemas graves da síndrome, porque, comumente, o aumento do número de cópias CGG anormal está presente em apenas um dos cromossomos X - o que pode ser compensado pelo funcionamento do outro gene normal contido no par.
Tal compensação não ocorre no sexo masculino, pois existe somente uma cópia do gene FMR1 no único cromossomo X do par X Y.
Daí, o porquê de apenas 1/3 de mulheres portadoras do gene alterado apresentarem algum grau de atraso intelectivo.

7. Como se pode suspeitar da SXF ou reconhecer seus sintomas ?

Os sinais e sintomas da SXF são numerosos. Eles variam conforme o grau de mutação ou pré-mutação em que se encontra o gene FMR1. Portanto, um caso específico pode apresentar poucas ou várias das características enumeradas a seguir.
As características fenotípicas (ou de aparência) são sutis. Nem sempre são facilmente reconhecidas, principalmente em mulheres. Pessoas com SXF podem até ser identificadas como tendo traços fisionômicos ditos "normais".
O reconhecimento da síndrome está associado mais freqüentemente à deficiência mental (de grau moderado a severo), acompanhada de alguns traços faciais e dismórficos, cuja manifestação pode evidenciar-se em fases mais tardias do desenvolvimento.
1.Características físicas:
Recém-nascidos não apresentam indícios de aparência física que antecipem uma suspeita precoce da SXF. De forma semelhante a outros quadros clínicos, apresentam macrocefalia (perímetro da cabeça maior que o normal) e hipotonia (baixo tônus muscular), podendo esta revelar-se, por exemplo, na falta de força para sugar na mamada.
Crianças maiores evidenciam:
·        Atrasos no desenvolvimento psicomotor, com aquisição tardia de posturas (sentar-se, por-se em pé, andar); dificuldades na coordenação de movimentos amplos e finos, inclusive nos requeridas pela motricidade oral para articular a fala.
·        Otites médias freqüentes e recorrentes, podendo produzir alterações que dificultam a percepção dos sons na aquisição da fala.
·        Pálato ogival ("céu da boca muito alto").
·        Má oclusão dentária.
·        Transtornos oculares (estrabismo, miopia).
·        Alterações em estruturas e funções cerebrais.
·        Convulsões e epilepsia.
·        Outros sintomas: alterações no aparelho osteoarticular (hiperextensibilidade dos dedos, especialmente das mãos; escolioses; pés planos ou "chatos"; peito escavado); alterações no aparelho cardiovascular (prolapso da válvula mitral; leve dilatação da aorta ascendente); pele fina e suave nas mãos.
Jovens e adultos podem apresentar:
·        Rosto alongado e estreito com leve projeção da mandíbula para a frente.
·        Orelhas proeminentes ou de tamanho maior que o normal, com implantação mais baixa.
·        Macroorquidismo (aumento do tamanho dos testículos por transtornos endocrinológicos) após a puberdade.
As três últimas características assinaladas são as manifestações físicas mais marcantes da síndrome a partir da adolescência, principalmente em homens.
2. Características emocionais e comportamentais:
Alterações na conduta, mesmo sendo inespecíficas da SXF, podem tornar-se importantes suspeitas para identificar seus primeiros sinais.
Elas requerem, contudo, uma observação e interpretação cuidadosas. Por exemplo, um indivíduo com SXF pode alterar seu comportamento num ambiente que mobilize a sua hipersensibilidade a estímulos visuais, ruídos, odores e a estímulos táteis, incluindo textura de alimentos.
São freqüentes manifestações como:
·        Hiperatividade e pouca capacidade de atenção.
·        Movimentos estereotipados, principalmente nas mãos, com ações repetitivas de mexer em determinados objetos, bater, morder as próprias mãos, etc.
·        Condutas do tipo autista, porém mais "intencionais" na comunicação com o ambiente e que, geralmente, desaparecem com o crescimento. Comportamentos perseverativos, com fixação em determinados objetos ou assuntos.
·        Ansiedade social e resistência a mudanças no ambiente, podendo ocorrer crises de pânico.
·        Traços de excessiva timidez e inibição social.
·        Contato ocular escasso.
·        Humor instável. Pessoas com X-Frágil podem ser alegres e sorridentes e ter dificuldades para controlar condutas explosivas, às vezes acompanhadas de agressividade verbal ou física (principalmente em homens adolescentes e jovens adultos).
Tais reações são freqüentemente precipitadas por excesso de estímulos no ambiente ou por exigências acima de suas capacidades.
Estudos têm revelado que as mulheres levemente afetadas - principalmente se forem mães de filhos também afetados - tendem a sofrer de instabilidade de humor, ansiedade e depressão, com dificuldades nas relações interpessoais.
3. Características cognitivas (área intelectual)
O comprometimento mental, seja em grau maior ou menor de retardo, pode mostrar-se desarmônico e não uniforme.
Na área da linguagem ( articulação da fala e linguagem como expressão de pensamento) ocorrem:
·        Dificuldades de comunicação e atrasos no aparecimento das primeiras palavras.
·        Alterações na programação e execução do ato motor da fala (dispraxias verbais), assim como na percepção e articulação de sons.
·        Alterações de ritmo e velocidade ( fala rápida e confusa).
·        Fala repetitiva e incoerente, com dificuldades para manter diálogo e fixar-se em assuntos da conversação, embora o uso de vocabulário relativamente desenvolvido seja observado.
Na área de processos e habilidades mentais, indivíduos afetados pela SXF podem manifestar:
·        Relativa facilidade em captar informações visuais do ambiente, percebendo-as de forma simultânea e "fortuita", mas com tendência a manter-se no nível globlizado (ou indiferenciado) de percepção.
·        Freqüentemente, fixam-se em detalhes visuais irrelevantes e dissociados de um todo com significado.
·        Melhor habilidade para aprender por imitação visual, chegando a resolver problemas práticos e concretos.
·        Dificuldades significativas em: reter informações, principalmente as que dependem de processamento auditivo, seqüencial e analítico ou de assimilar noções abstratas (como as requeridas pela leitura /escrita: perceber, relacionar e fixar seqüências na estrutura de sons e letras com significado); resolver situações-problemas mais abstratas e complexas; generalizar e aplicar informações em situações novas.
Há, portanto, diversas características da SXF que se assemelham aos sintomas de outros quadros clínicos de atrasos e transtornos de desenvolvimento.
A investigação clínica deve, pois, estar atenta para a análise da história familiar, principalmente quando esta inclui a ocorrência de problemas persistentes de aprendizagem e/ou de retardo mental em outros membros da família.
As manifestações da síndrome podem ser avaliadas por escalas de critérios quantitativos e qualitativos já existentes. Os parâmetros contidos nessas escalas permitem o levantamento de suspeitas ou uma aproximação diagnóstica, revelando a necessidade ou não do diagnóstico molecular que confirme a síndrome.

8. Como é feito o diagnóstico genético, quando é recomendado e qual a sua importância ?

O diagnóstico tornou-se mais preciso a partir de 1991, quando o gene FMR1 foi descoberto. Com base em estudo molecular (DNA), identifica-se o número de cópias CGG deste gene. Esse teste pode ser prescrito por qualquer médico. É realizado através de uma amostra de sangue encaminhada para análise em laboratórios de genética, especializados em diagnóstico molecular.
O exame pré-natal também é possível, sendo recomendado quando existe diagnóstico confirmado na família e sabe-se que a gestante é portadora da pré-mutação.
Pelo fato dos sintomas da SXF serem bastante sutis, especialmente em crianças pequenas - e devido à sua alta freqüência entre a população - profissionais especializados recomendam a prova do X-Frágil para avaliar ou reavaliar casos de atraso de desenvolvimento e retardo mental de origem desconhecida.
O desconhecimento da síndrome e o fato de seus sintomas serem similares a outros quadros clínicos parecem contribuir para que muitos casos ainda se mantenham com diagnósticos obscuros e imprecisos.
No caso da SXF, a família pode identificar a origem dos problemas e melhor compreendê-los para buscar tratamentos mais específicos. Além disso, o conhecimento dos padrões de transmissão da doença auxilia na previsão das probabilidades de um descendente herdá-la ou não.
O assessoramento e o aconselhamento genético, logo após a confirmação da doença, são auxílios decisivos para um casal planejar seu futuro, sabendo dos riscos de transmissão.
Em termos de saúde pública, a doença implica em alto custo econômico e social.
Portanto, a confirmação da SXF - precoce ou mesmo tardia - é sempre recomendada. Não somente para aconselhamento genético, mas também para redirecionar terapias que tenham sido ou estão sendo desenvolvidas, tornando-as mais específicas e compatíveis com as peculiaridades da doença.

Na realidade atual, são as intervenções de atendimentos especializadas que podem minimizar os problemas da SXF.
Mas, os custos dos diversos atendimentos requeridos pelos seus sintomas são elevados em todos os níveis, seja para a família ou para os próprios serviços especializados.
Juntamente com a carga emocional, esses fatores são estressantes para as famílias afetadas, visto que os problemas causados pela SXF permanecem por toda a vida.
Dependendo das necessidades de cada caso, são realizados diversos tratamentos ao longo das etapas de desenvolvimento de um indivíduo afetado. Eles envolvem acompanhamento clínico em diversas especialidades, com ênfase nas áreas de:
·        acompanhamento pediátrico, neurológico e/ou psiquiátrico (com intervenções psicofarmacológicas);
·        estimulação precoce para o desenvolvimento da área psicomotora;
·        atendimento fonoaudiológico, para aquisição da fala (motricidade oral / fonoarticulação), desenvolvimento e organização da linguagem oral e escrita;
·        psicoterapia familiar e/ou individual;
·        atendimento psicopedagógico clínico (para os transtornos de aprendizagem, organização e desenvolvimento do potencial intelectivo);
·        educação escolar, especial ou regular;
·        terapia ocupacional e outros.
Pesquisas sobre a SXF, juntamente com dados de experiência clínica coletados nos últimos anos, podem redirecionar tais atendimentos, tornando-os cada vez mais compatíveis com os problemas da síndrome.
Especialmente no atendimento da área intelectiva, é recomendável que procedimentos, metodologias e recursos sejam adaptados - e até criados - para desenvolver mais intensamente as áreas mais fortes e minimizar as áreas mais prejudicadas, presentes nos indivíduos com X-Frágil, conforme descrições já disponibilizadas por tais pesquisas.
Os recursos de informática em multimídia, por exemplo, pode ser adaptados para enfatizar e facilitar a via de estimulação visual (gráfica/animada) e auditiva que essas pessoas necessitam para melhor desenvolver suas aprendizagens. A utilização do computador tem sido enfatizada, a partir de experiências terapêuticas e educacionais realizadas tanto na área da linguagem (fala/leitura/escrita) como no desenvolvimento das habilidades de raciocínio.
O que se persegue, portanto, são estudos e pesquisas que sinalizem procedimentos e recursos cada vez mais específicos para as pessoas afetadas pela SXF. Busca-se o diagnóstico, o tratamento mais precoce e especializado possível da doença. Objetiva-se mediar, intensa, metodica e continuamente o desenvolvimento máximo do potencial de inteligência e de aprendizagem disponíveis em cada indivíduo afetado.
Às pessoas afetadas pela SXF, deve-se propiciar e facilitar as aprendizagens escolares e ocupacionais que possam atingir, estimulando tanto a aquisição de habilidades mentais como a adoção de condutas adequadas para sua inserção digna na sociedade.
Conforme citação veiculada pela Associação Síndrome X Frágil do Uruguai, "o melhor prognóstico, mais que o diagnóstico, é a capacidade de aprendizagem e evolução que toda pessoa tem".

Atualmente, ainda não há cura para a SXF.
Na área biomédica realizam-se intensas pesquisas para entendimento de mecanismos e tratamentos potenciais para as desordens herdadas. Em tais estudos incluem-se perspectivas futuras de tratamento para a SXF. Por exemplo, estão sendo investigadas:
·        Terapia do gene, estudando o que causa o X-Frágil e procurando determinar um outro gene saudável, que possa ser inserido nas células afetadas para substituir o gene mutante deficiente.
·        Terapia de reposição da proteína, estudando a proteína que falta, devido à mutação, e as possibilidades de introduzí-la por uma fonte externa capaz de aliviar alguns dos sintomas cognitivos e comportamentais.
·        Psicofarmacologia, pesquisando o uso de medicações específicas correlacionadas aos distúrbios intelectivos, emoci-onais e comportamentais da síndrome.

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