O que é Psicomotricidade?

A HISTÓRIA DA PSICOMOTRICIDADE

A história da psicomotricidade começa desde que o homem é humano, quer dizer, desde que o homem fala, já que a partir deste instante falará seu corpo também. Apesar da psicomotricidade se desenvolver como uma prática independente no século XX, seu nascimento ocorre no momento em que o corpo deixa de ser pura carne para transformar-se num corpo falado. A história da psicomotricidade é solidária à história do corpo.

Já no século XIX, com o desenvolvimento e as descobertas da neurofisiologia, começa a constatar-se que há diferentes disfunções graves sem que o cérebro esteja lesionado ou sem que a lesão esteja localizada claramente. São descobertos "distúrbios da atividade gestual", da atividade práxica, sem que anatomicamente estejam circunscritos a uma área ou parte do sistema nervoso. Portanto o "esquema estático anátomo-clínico" que determinava para cada sintoma sua correspondente lesão focal já não podia explicar alguns fenômenos patológicos. Justamente é a necessidade médica de encontrar uma área que explique certos fenômenos clínicos que nomeia pela primeira vez a palavra psicomotricidade, no anos de 1870.

As primeiras pesquisas que dão origem ao campo psicomotor correspondem a um enfoque eminentemente neurológico. Dupré, em 1909, a partir de seus estudos clínicos, define a síndrome da debilidade motora, composta de sincinesias, paratonias e inabilidades, sem que estas sejam atribuíveis a um dano ou lesão extrapiramidal. A figura de Dupré é de fundamental importância para o âmbito psicomotor, já que é ele quem afirma a independência da debilidade motora de um possível correlato neurológico. É este neurologista francês que rompe com os pressupostos da correspondência biunívoca entre a localização neurológica e as perturbações motoras da infância. Como afirma Bergès, " É deste modo que a psicomotricidade separou-se progressivamente da neuropsicopatologia do movimento", ainda que Dupré estabeleça certa correspondência entre a debilidade motora e debilidade mental.

Henry Wallon, em 1925, ocupa-se do movimento humano dando-lhe uma categoria fundante como instrumento na construção do psiquismo. Ele estuda a relação entre motricidade e caráter, diferentemente de Dupré, que correlaciona a motricidade com a inteligência. Esta diferença permite a Wallon relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio ambiente e aos hábitos da criança.

A prática psicomotora começa com Edouard Guilmain, em 1935, que estabelece um exame psicomotor, determinando um novo método de trabalho: a reeducação psicomotora, que estabelece por meio de diferentes técnicas (provenientes da neuropsiquiatria infantil) um modelo de exercitações com exercícios para reeducar a atividade tônica (exercícios de mímica e de equilíbrios), a atividade de relação e o controle motor (exercícios rítmicos, de coordenação e habilidade motora, e exercícios que tendem a diminuir sincinesias).

Neste primeiro momento da prática psicomotora, é estabelecida uma correlação entre a debilidade motora, entre o caráter e a atividade cinética. Em 1947, Julian de ajuriaguerra, redefinem o conceito de debilidade motora considerando-a como uma síndrome com suas próprias particularidades. Ajuriaguerra junto com Giselle Soubiran, acentuam estas concepções numa carta dirigida à Escola Francesa de Terapia Psicomotora, no ano de 1960.

O exame ou avaliação psicomotora, com suas respectivas provas, é aperfeiçoado e é estabelecido um método e um diagnóstico destinados a delimitar o transtorno psicomotor com suas características e a orientar as modalidades de intervenção do terapeuta. Já na década de 70, a psicomotricidade é definida como uma motricidade em relação. Começa a ser delimitada uma diferença entre uma postura reeducativa e uma terapêutica que vai dando progressivamente maior importância à relação, à afetividade e ao emocional.

É por esta via que vários autores da psicanálise, como S. Freud, Winnicott, Schilder e Lacan, começam a ser tomados e citados de um modo fragmentado pelos psicomotricistas, a partir desta preocupação que se apresenta e em apoio às suas hipóteses sobre a vida emotiva. André Lapierre e Aucoutourier, delimitam suas posturas e na mesma época, em 1977, Samí Alí, propõe um esboço de uma teoria psicanalítica da psicomotricidade.

Porém, é só na década de 1970 que a psicomotricidade clínica vai registrar seus inícios fora do campo especificamente educativo, tendo como ponto de partida a influência da psicomotricidade francesa. Nesta época, na França, a prática clínica era basicamente reeducativa, a partir dos trabalhos de Ajuriaguerra, Wallon e Piaget.

Aproximadamente em 1975, Lydia F. de Coriat, propõe por escrito às autoridades educativas a necessidade da existência da carreira de psicomotricidade na Universidade de Buenos aires. À escassa bibliografia traduzida do âmbito psicomotor na década de 70 acrescentam-se com o passar do tempo diferentes autores franceses como Le Bouch, Pick, Vayer, Lebovici, Coste, Lapierre. A eles, por sua vez, somam-se autores da Argentina como Dalila Costallat, Esparza e Petroli, que se ocupam especificamente da psicomotricidade na infância.

No ano de 1977 é criada a Associación Argentina de Psicomotricidad, e a partir de 1980 a difusão e extensão da psicomotricidade na Argentina é acrescida e propagada, porém ainda sem um reconhecimento que legalize a sua prática.

Portanto, o sujeito diz com seu corpo, com sua motricidade, com seus gestos e, portanto, espera ser olhado e escutado na transferência desde um lugar simbólico.



A PSICOMOTRICIDADE NO BRASIL
 A Psicomotricidade no Brasil foi norteada pela escola francesa. Durante as primeiras décadas do século XX, época da primeira guerra mundial, quando as mulheres adentraram firmemente no trabalho formal enquanto suas crianças ficavam nas creches, a escola francesa também influenciou mundialmente a psiquiatria infantil, a psicologia e a pedagogia. . Neste período o tônus axial começava a ser estudado por André Thomas e Saint-Anné Dargassie. Em 1925, Henry Wallon, médico psicólogo, ocupa-se do movimento humano dando-lhe uma categoria fundante como instrumento na construção do psiquismo. Esta diferença permite a Wallon relacionar o movimento ao afeto, à emoção, ao meio ambiente e aos hábitos do indivíduo, e discursar sobre o tônus e o relaxamento. Em 1947, Julian de Ajuriaguerra, psiquiatra, redefine o conceito de debilidade motora, considerando-a como uma síndrome com suas próprias particularidades. É ele quem delimita com clareza os transtornos psicomotores que oscilam entre o neurológico e o psiquiátrico. Ajuriaguerra aproveitou os subsídios de Wallon em relação ao tônus ao estudar o diálogo tônico. A relaxação psicotônica foi abordada por Giselle Soubiran (SBP, 2003) e (ISPE-GAE, 2007).

    “No Brasil, Antonio Branco Lefévre buscou junto as obras de Ajuriaguerra e Ozeretski, influenciado por sua formação em Paris, a organização da primeira escala de avaliação neuromotora para crianças brasileiras.
Dra. Helena Antipoff, assistente de Claparéde, em Genebra, no Institut Jean-Jacques Rosseau e auxiliar de Binet e Simon em Paris, da escola experimental "La Maison de Paris", trouxe ao Brasil sua experiência em deficiência mental, baseada na Pedagogia do interesse, derivada do conhecimento do sujeito sobre si mesmo, como via de conquista social... Em 1972, a argentina, Dra. Dalila de Costallat, estagiária do Dr. Ajuriaguerra e da Dra. Soubiran em Paris, é convidada a falar em Brasília às autoridades do Ministério da Educação, sobre seus trabalhos em deficiência mental e inicia contatos e trocas permanentes com a Dra. Antipoff no Brasil” (ISPE-GAE, 2007).

    Com estas novas contribuições, a psicomotricidade diferencia-se de outras disciplinas, adquirindo sua própria especificidade e autonomia. Em 1977 é fundado GAE, Grupo de Atividades Especializadas, que veio a promover a partir de 1980 vários encontros nacionais e latino-americanos. O 1° Encontro Nacional de Psicomotricidade foi realizado em 1979. O GAE é responsável pela parte clínica e o ISPE, Instituto Superior de Psicomotricidade e Educação, destinado à formação de profissionais em psicomotricidade, se dedica ao ensino de aplicações da psicomotricidade em áreas de saúde e educação. Em 1982, o ISPE-GAE realiza o vínculo científico-cultural com a Escola Francesa através da exclusiva Delegação Brasileira da OIPR - Organisation Internationale de Psychomotricité et de Relaxation. A SBP - Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, entidade de caráter científico-cultural sem fins lucrativos, foi fundada em 19 de abril de 1980 com o intuito de lutar pela regulamentação da profissão, unir os profissionais da psicomotricidade e contribuir para o progresso da ciência, promovendo congressos, encontros científicos, cursos, entre outros. Começa então, a ser delimitada uma diferença entre postura reeducativa e uma terapêutica, já demonstrando diferenças em intervenções da Psicomotricidade, e que, ao despreocupar-se da técnica instrumentalista e ao ocupar-se do corpo em sua globalidade, vai dando progressivamente, maior importância à relação, à afetividade e ao emocional, acompanhando as tendências do momento por que passava. No entanto, sob o prisma do discurso da SBP, a psicomotricidade não é a soma da psicologia com a motricidade, ela tem valor em si. Para o psicomotricista, o conceito de unidade ultrapassa a ligação entre psico e soma. O indivíduo é visto dentro de uma globalidade, e não num conjunto de suas inclinações (SBP, 2003) e (ISPE-GAE, 2007).
    Encontramos várias definições para a Psicomotricidade. Cada autor coloca o seu olhar para defini-la. A ISPE-GAE e a SBP definem respectivamente a Psicomotricidade e o emprego de seu termo como:


    “Psicomotricidade é uma neurociência que transforma o pensamento em ato motor harmônico. É a sintonia fina que coordena e organiza as ações gerenciadas pelo cérebro e as manifesta em conhecimento e aprendizado.

    Psicomotricidade é a manifestação corporal do invisível de maneira visível.

    É uma ciência terapêutica adotada na Europa há mais de 60 anos, principalmente na França, que instituiu o primeiro curso universitário de Psicomotricidade em 1963 (ISPE-GAE, 2007).

    a ciência que tem como objeto de estudo o homem através do seu corpo em movimento e em relação ao seu mundo interno e externo, bem como suas possibilidades de perceber, atuar, agir com o outro, com os objetos e consigo mesmo. Está relacionada ao processo de maturação, onde o corpo é a origem das aquisições cognitivas, afetivas e orgânicas. (S.B.P.1999)

    Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma concepção de movimento organizado e integrado, em função das experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização” (SBP, 2003).

    Nas palavras de Defontaine: “La Psychomotricité est le désir de faire, du vouloir faire; lê savoir faire et le pouvoir faire” (DEFONTAINE apud OLIVEIRA, 2001, p. 28). “A psicomtricidade é um caminho, é o desejo de fazer, de querer fazer; o saber fazer e o poder fazer” (ibidem, 2001, p. 34). Defontaine declara que só poderemos entender a psicomotricidade através de uma triangulação corpo, espaço etempo. Defontaine define os dois componentes da palavra; psico significando os elementos do espírito sensitivo, e motricidade traduzindo-se pelo movimento, pela mudança no espaço em função do tempo e em relação a um sistema de referência (ibidem, 2001, p. 35). O Prof. Dr. Júlio de Ajuriaguerra, a Profª. Drª. Dalila M. M. de Costallat e a Profª. Drª. Maria Beatriz da Silva Loureiro, fundadora do GAE e do ISPE, conceituam e definem respectivamente a Psicomotricidade de seguinte modo:


    “A Psicomotricidade se conceitua como ciência da Saúde e da Educação, pois indiferente das diversas escolas, psicológicas, condutistas, evolutistas, genéticas, etc. ela visa a representação e a expressão motora, através da utilização psíquica e mental do indivíduo (AJURIAGUERRA apud ISPE-GAE, 2007).

    Psicomotricidade é a ciência de síntese, que com a pluralidade de seus enfoques, procura elucidar os problemas, que afetam as interrelações harmônicas, que constituem a unidade do ser humano e sua convivência com os demais (COSTALLAT apud ISPE-GAE, 2007).

    A Psicomotricidade é a otimização corporal dos potenciais neuro, psico-cognitivo funcionais, sujeitos as leis de desenvolvimento e maturação, manifestados pela dimensão simbólica corporal própria, original e especial do ser humano” (LOUREIRO apud ISPE-GAE, 2007).
    Já Fonseca afirma que se deve tentar evitar uma análise desse tipo para não cair no erro de enxergar dois componentes distintos: o psíquico e o motor, pois ambos são o mesmo (FONSECA apud OLIVEIRA, 2001). A psicomotricidade para Fonseca não é exclusiva de um novo método ou de uma “escola” ou de uma “corrente” de pensamento, nem constitui uma técnica, um processo, mas visa fins educativos pelo emprego do movimento humano (ibidem, 2001).
    Para Nicola, uma conceituação atual de psicomotricidade é que esta ciência nova, cujo objeto de estudo é o homem nas suas relações com o corpo em movimento, encontra sua aplicação prática em formas de atuação que configuram uma nova especialidade. A psicomotricidade estuda o homem na sua unidade como pessoa (NICOLA, 2004, p. 5). Nicola ainda fornece outro conceito, pautada na soma do termo Motricidade e do prefixo Psico:

    “Motricidade: por definição conceitual é a propriedade que têm certas células nervosas de determinar a contração muscular.
    Psico (Gr Psyquê): vem representar a alma, espírito, intelecto.
    Psicomotricidade: condição de um estado de coisas corpo / mente. Visão global de um indivíduo, onde a base de atuação está no conhecimento desta fusão.” (ibidem, 2004, p. 5).

    No geral, os psicomotricistas não costumam gostar do termo motricidade, pois enxergam a motricidade indissociável da psique humana. O termo motricidade é mais utilizado pela área da educação física no âmbito da perspectiva do treinamento esportivo, ligado à coordenação motora como qualidade física, sendo interpretado de forma diferente da perspectiva da Psicomotricidade. Também há uma área do conhecimento que trata a motricidade como um dos seus objetos teóricos e práticos de estudo: é a da Ciência da Motricidade Humana - CMH, ou Cineantropologia, articulada com um corpo epistemológico próprio e que enfoca a motricidade sob um paradigma diferente do da Psicomotricidade. Mas visto que, quando se aborda a motricidade humana, a psique humana não é deixada de fora, certos embates semânticos não merecem tantas linhas de discussão. È necessário observar os objetos de estudos sob a perspectiva de cada área do conhecimento para uma compreensão isenta de poluição epistemológica ou preconceito científico.
    O conceito de Ciência da Motricidade Humana do Programa de Ciência da Motricidade Humana da Universidade Castelo Branco, Rio de Janeiro, é o seguinte:

    “Ciência da Motricidade Humana é a área do saber que estuda as múltiplas possibilidades intencionais de interpretação do ser do Homem e de suas condutas e comportamentos motores no âmbito da fenomelalogia existencial transubjetiva e da filosofia dos valores, ou seja, a partir da complexidade cultural de uma vida existencial inserida em um contexto de circunstância e facticidade e de corporeidade de um “ser Humano”, do “ente” (do Ser do Homem), em um permanente estado de necessidades, oriundas de suas carências, privações ou vacuidades de natureza: bio-físicas; bio-psíquicas ou emocionais; bio-morais (bioética) ou humanas; bio-sociais ou históricas; e bio-transcendentes ou cósmicas. Tais possibilidades de interpretação são operacionalizadas de forma multidisciplinar, interdisciplinar, transdisciplinar e através dos mecanismos cognoscitivos da pré-compreensão fenomenológica, da explicação fenomênica e da ordenação axiológica.” (BERESFORD, 2004).

    Nesta citação e também em outros trabalhos de autores que compõe o corpo epistemológico da CMH, nos deparamos com diversos conceitos que são encontrados nesta área, como: conduta motora, comportamento motor, corporeidade, comunicação motora, ergomotricidade, ludomotricidade, ludoergomotricidade, entre outros. Para não alongar demais este trabalho e por já estar trabalhando com o conceito de motricidade, foi escolhido somente este para perfazer um pequeno esboço da perspectiva da CMH para a motricidade:

    “Motricidade: Processo adaptativo, evolutivo e criativo de um ser práxico, carente dos outros, do mundo e da transcedência. Intencionalidade operante, segundo Maurice Merleau-Ponty. O físico, o biológico e o antropossociológico estão nela, como a dialética numa totalidade. Como ser carente, o homem é um ser práxico e onde, por isso, a motricidade se afirma na intencionalidade electiva. Mas a motricidade humana e, conseqüentemente, cultura, acima do mais – cultura não ancilosada em erudição inerte, mas cultivada porque praticada. Amotricidade não se confunde com a motilidade. Esta não excresce a faculdade de execução de movimentos que resultam da contração de músculos lisos ou estriados. A motricidade está antes da motilidade, porque tem a ver com os aspectos psicológico, organizativo, subjetivo do movimento. A motricidade é o virtual e a motilidade, o actual, de todo o movimento. Afinal, a motilidade é expressão da motricidade.” (CUNHA, 1994, p. 156).

    Continuando a conceituação por outros autores, de acordo com Neto: “A motricidade é a interação de diversas funções motoras (perceptivomotora, neuromotora, psicomotora, neuropsicomotora, etc.)” (NETO, 2002, p. 12). Na visão de De Meur & Staes “a psicomotricidade quer justamente destacar a relação existente entre a motricidade, a mente e a afetividade e facilitar a abordagem global da criança por meio de uma técnica.” (DE MEUR & STAES, 1991, p. 5).
    Segundo uma definição considerada por Jacques Chazaud, citada por Alves, “a psicomotricidade consiste na unidade dinâmica das atividades, dos gestos, das atitudes e posturas, enquanto sistema expressivo, realizador e representativo do “ser-em-ação” e da “coexistência” com outrem” (CHAZAUD apud ALVES, 2003, p. 15).
    Sob o ponto de vista do “ser-em-ação” e também abordando sob um enfoque histórico-antropológico, podemos recorrer aos estudos de Harrow (apud OLIVEIRA, 2001), que faz uma análise sobre o homem primitivo ressaltando como o desafio de sua sobrevivência estava ligado ao desenvolvimento psicomotor e seu caráter utilitário. As atividades básicas consistiam em caça, pesca e colheita de alimentos e, para isto, os objetivos psicomotores eram essenciais para a continuação da existência em grupo. Necessitavam de agilidade, força, velocidade, coordenação. A recreação, os ritos cerimoniais e as danças em exaltação aos deuses, a criação de objetos de arte também eram outras atividades desenvolvidas por eles. Tiveram que estruturar suas experiências de movimentos em formas utilitárias mais precisas. Hoje, o homem também necessita destas habilidades embora tenha se aperfeiçoado mais para uma melhor adaptação ao meio em que vive. Necessita ter um bom domínio corporal, boa percepção auditiva e visual, uma lateralização bem definida, faculdade de simbolização, orientação espaço-temporal, poder de concentração, percepção de forma, tamanho, número, domínio dos diferentes comandos psicomotores como coordenação fina, global, equilíbrio. Harrow cita ainda os sete movimentos ou modelos de movimentos básicos inerentes ao homem que são: correr, saltar, escalar, levantar peso, carregar (sentido de transportar), pendurar e arremessar; todos eles básicos em trabalhos de práticas e vivências psicomotoras atuais.
    O Laboratório de Currículos da Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro em 1981 define a educação psicomotora como a educação da criança através de seu próprio corpo e de seu movimento. A criança é vista em sua totalidade e nas possibilidades que apresenta em relação ao meio ambiente, isto é, a educação deve ser feita em função da idade e dos interesses das crianças. Desta forma, a passagem de uma fase para outra será gradativa e dentro do tempo próprio de cada criança. O professor deve acompanhar este tempo sem tentar forçar uma antecipação. Por isso, a psicomotricidade tem como ponto de partida o desenvolvimento psicológico da criança, na medida em que acompanha as leis do amadurecimento do sistema nervoso através da mielinização. Uma das suas finalidades é preparar a base para a educação daquelas capacidades indispensáveis à aprendizagem escolar, evitando dificuldades tão comuns à alfabetização (ARAÚJO, 1998).
    Observamos que o Laboratório de Currículos da Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro toma como ponto de partida para o desenvolvimento da criança o aspecto psicológico e do sistema nervoso, quanto ao aspecto da maturação da mielinização, o quê podemos constatar nos estudos de Fonseca.
    Para Lapierre e para Le Boulch apud Oliveira, a educação psicomotora deve ser uma formação de base indispensável a toda criança (OLIVEIRA, 2001). Para Oliveira, o movimento é um suporte que ajuda a criança adquirir o conhecimento do mundo que a rodeia através de seu corpo, de suas percepções e sensações (ibidem, 2001). De acordo com esta autora, a psicomotricidade se propõe a permitir ao homem “sentir-se bem na sua pele”, permitir que se assuma como realidade corporal, possibilitando-lhe a livre expressão de seu ser; pois de acordo com a autora, o indivíduo não é feito de uma só vez, mas se constrói, paulatinamente, através da interação com o meio e de suas próprias realizações e a psicomotricidade desempenha aí um papel fundamental (ibidem, 2001).
    Le Boulch aponta correntes distintas na psicomotricidade. Enquanto uma aponta para a educação psicomotora, outra, para a terapia e reeducação psicomotora (LE BOULCH, 1982). Estas correntes já apontam não só para diferentes intervenções, de um modo superficial, sob a perspectiva de mercado e atuação profissional, mas, sobretudo, de diferentes olhares.
    Fonseca nos diz que, a psicomotricidade tende atualmente a ser reconceitualizada, não só pela “intrusão” de fatores antropológicos, filogenéticos, ontogenéticos, paralingüísticos, como essencialmente cibernéticos e psiconeurológicos. È na integração transdisciplinar destas áreas do saber que provavelmente se colocará no futuro a evolução e atualização do conceito de psicomotricidade (FONSECA, 1995). Deste modo, Fonseca expõe um fato comum que ocorre em todas as áreas da Ciência, devido à quantidade de informações que devem ser compartilhadas, pelas atuações e trabalhos transdisciplinares, e pelos diferentes novos olhares e abordagens que vêm surgindo a todo instante nas mais diferentes áreas.
    Para Lorenzon, em relação à definição da psicomotricidade convém referir que seu estudo é recente, pois ainda no início deste século era tratada excepcionalmente. Pouco a pouco, a psicomotricidade afirma-se em diversas orientações que atualmente tentem agrupar-se (LORENZON, 1995). Neste sentido é natural que instituições norteadoras da área, como a SBP, apontem os conceitos, definições e abrangência de atuação. Neste caso, Psicomotricista, segundo a SBP, é o profissional da área de saúde e educação que pesquisa, ajuda, previne e cuida do Homem na aquisição, no desenvolvimento e nos distúrbios da integração somapsíquica (SBP, 2003).
    Suas áreas de atuação segundo a SBP são: “Educação, Clínica (Reeducação, Terapia), Consultoria e Supervisão.” (ibidem, 2003). A intervenção psicomotora também pode ser diversificada. Mas Mello aponta três áreas básicas de atuação psicomotora:

    “Nos estudos dos pesquisadores recentes, são apontados três principais campos de atuação ou formas de abordagem da Psicomotricidade: 1. Reeducação Psicomotora; 2. Terapia Psicomotora; e 3. Educação Psicomotora. Embora em certos trabalhos esses três níveis de atuação cheguem a confundir-se, existem características próprias em cada um deles.” (MELLO, 2002, p. 33).

    De acordo com Neto, na atualidade, existe um grande número de profissionais de áreas diversas que utilizam a motricidade ou a psicomotricidade em diferentes contextos e em diferentes faixas etárias, como em escolas, clínicas de reabilitação, academias, hospitais e outros (NETO, 2002). Segundo ele:

    “profissionais de medicina (pediatria, psiquiatria, neurologia e reabilitação infantil); psicologia (psicologia evolutiva, do esporte e especial); educação física e pedagogia (ensino regular e fundamental); fisioterapia e fonoaudiologia. A análise dessa realidade leva à busca de critérios claros que justifiquem tal situação de heterogeneidade – tanto no âmbito da interpretação de aspectos teóricos fundamentais como nas decisões relativas à sua aplicação.” (ibidem, 2002, p. 12).

    Tamanha diversificação profissional, áreas e sub-áreas não muito bem delimitadas, assim como, competências que acabam por invadir determinadas intervenções, podem causar conflitos em áreas de intervenção profissional. A clientela atendida pelo psicomotricista, como veremos, também é diversificada. Segundo a SBP, esta clientela é a seguinte:

    “Crianças em fase de desenvolvimento; bebês de alto risco; crianças com dificuldades/atrasos no desenvolvimento global; pessoas portadoras de necessidades especiais: deficiências sensoriais, motoras, mentais e psíquicas; pessoas que apresentam distúrbios sensoriais, perceptivos, motores e relacionais em conseqüência de lesões neurológicas; família e a 3ª idade.” (SBP, 2003).

    E o mercado de trabalho do psicomotricista, o qual mais uma vez podemos caracterizar amplo e diversificado, segundo a SBP consiste em creches; escolas; escolas especiais; clínicas multidisciplinares; consultórios; clínicas geriátricas; postos de saúde; hospitais; empresas (ibidem, 2003). Como observamos, a atuação do psicomotricista, profissão não regulamentada, cujo alguns entendem estar englobada pela área da Educação Física, quando se trata de atuar no âmbito das atividades físicas, certas vezes pode, portanto, adentrar também no âmbito da reabilitação, área característica da Fisioterapia e em certos casos da Fonoaudiologia e da Medicina e Psicologia.





A PSICOMOTRICIDADE HOJE

Há pessoas que apesar de possuírem uma inteligência normal ou até superior, apresentam uma atuação diferente das outras, com movimentos desajeitados, lentos, com dificuldades na leitura e escrita.
Equilíbrio, tonicidade, orientação espacial e temporal, esquema corporal, imagem corporal, lateralidade, coordenação motora, ritmo, são estruturas psicomotoras necessárias para que nosso organismo explore o ambiente, perceba-se nesse mesmo ambiente, perceba o outro e, com isso, se desenvolva. Temos então a Psicomotricidade como uma proposta de educação do ser em sua globalidade, unindo o movimento e o psiquismo. Faz-se essa relação inseparável, na qual todo movimento é dependente do psiquismo que o produz, ao mesmo tempo em que o psiquismo é inseparável dos movimentos que o faz desenvolver. Assim tem-se: CORPO=SENTIR+AGIR+PENSAR

A Sociedade Brasileira de Terapia Psicomotora (1982), atual Sociedade Brasileira de Psicomotricidade, propôs uma definição bastante abrangente do que vem a ser a Psicomotricidade: " Psicomotricidade é uma ciência que tem por objetivo o estudo do homem através do seu corpo em movimento, nas relações com seu mundo interno e externo".
Portanto, sua função é buscar equilíbrio entre as funções motora, cognitiva e psíquica (sócio-afetiva) para que se tenha a expressão do ato motor coeso e preciso.

Para o psicomotricista, a criança constitui sua unidade a partir das interações com o mundo externo e nas ações do outro sobre ela.
Em sua prática, a Psicomotricidade nos revela pela afirmação de Coste (1978) que o "homem é o seu corpo", nos dando a visão de que precisamos atuar nesse corpo e assim como confirma Hedina (1987): 
"Para que uma pessoa se exprima enquanto que corpo mais livremente seus próprios desejos, é necessário que ela cresça, não em sua individualidade absoluta, mas em suas relações com os outros e o mundo".
Enfim, a Psicomotricidade é, portanto, uma sintonia fina que coordena e organiza as ações gerenciadas pelo cérebro e as manifesta em conhecimento e aprendizado; é uma ciência que busca a associação dinâmica que leva do ato ao pensamento, do gesto à palavra, do símbolo ao conceito; a capacidade de movimentar-se com intencionalidade de tal forma que o movimento pressupõe o exercício de múltiplas funções psicológicas, memória, atenção, raciocínio...uma ciência que se ocupa do homem e de seu corpo em movimento nas relações do nível interno e externo.
O movimento é fundamental para o desenvolvimento intelectual e emocional, permitindo diferentes formas de explorar o mundo e seu corpo. Surge na escola, por exemplo, com uma corda, o que pode liberar diferentes formas, surgindo afeto, prazer e imaginação. Tudo que é pensado deve ser mostrado, pois o corpo é um meio para se conhecer a realidade. Assim, quanto mais o meio permitir, mais o indivíduo amplia suas percepções e controla seu corpo. 














Avaliação Motora (Rosa Neto, 2002) from Sidney da Silva on Vimeo.